O consumo de alimentos ultraprocessados, como refrigerantes, salgadinhos, biscoitos recheados e muitos outros produtos amplamente disponíveis nas prateleiras de supermercados, tem se tornado um problema significativo de saúde pública no Brasil e no mundo. De acordo com um estudo recente da Fiocruz em parceria com o Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da USP, os custos associados ao consumo desses alimentos ultrapassam R$ 10,4 bilhões ao ano no Brasil. Esse valor inclui os gastos diretos com o Sistema Único de Saúde (SUS), perdas econômicas devido a mortes prematuras e custos previdenciários.

O Papel do SUS no Combate às Doenças Relacionadas aos Ultraprocessados

O Sistema Único de Saúde, essencial para garantir o acesso universal à saúde no Brasil, é diretamente impactado pelos efeitos nocivos dos ultraprocessados. Segundo o estudo, quase R$ 933,5 milhões são gastos anualmente com internações, consultas e medicamentos para tratar doenças como obesidade, diabetes tipo 2 e hipertensão, todas relacionadas ao consumo desses alimentos.

O SUS desempenha um papel crucial não apenas no tratamento dessas condições, mas também na prevenção, por meio de campanhas de conscientização e promoção da saúde. No entanto, o aumento no consumo de ultraprocessados torna cada vez mais difícil lidar com a carga crescente de doenças crônicas, que consomem uma parte significativa do orçamento da saúde pública.

Mortes Prematuras: Uma Tragédia Econômica e Humana

O impacto econômico do consumo de ultraprocessados vai além dos custos diretos ao SUS. Estima-se que 57 mil mortes prematuras sejam atribuíveis ao consumo desses alimentos todos os anos no Brasil. Essas mortes ocorrem em indivíduos entre 30 e 69 anos, a faixa etária considerada economicamente ativa. O estudo calcula que as perdas econômicas associadas a essas mortes somam impressionantes R$ 9,2 bilhões por ano.

Essas perdas não se restringem apenas ao impacto emocional e social para as famílias, mas também têm um custo elevado para a economia. Trabalhadores produtivos que deixam o mercado de trabalho precocemente representam uma perda irreparável para o país. O cálculo levou em conta fatores como salário médio, idade de aposentadoria e taxa de emprego, destacando como o problema afeta o desenvolvimento econômico nacional.

O Que São Alimentos Ultraprocessados?

Os alimentos ultraprocessados são produtos industriais que passam por várias etapas de processamento, incluindo a adição de ingredientes refinados, como gorduras e amidos, e aditivos químicos, como corantes, aromatizantes e conservantes. Esses produtos são formulados para serem altamente palatáveis, comumente ricos em açúcar, sal e gorduras, mas pobres em valor nutricional. Exemplos incluem refrigerantes, sopas instantâneas, nuggets, biscoitos recheados e salgadinhos.

Apesar de sua conveniência e apelo ao paladar, o consumo frequente de ultraprocessados está associado a uma série de problemas de saúde, como aumento de peso, inflamação crônica e resistência à insulina. Essas condições são fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes tipo 2, hipertensão e doenças cardiovasculares.

Impacto Regional e Nacional

Embora o consumo de ultraprocessados seja um problema nacional, algumas regiões apresentam um impacto maior. Estados como Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo têm uma porcentagem de mortes relacionadas aos ultraprocessados superior à média nacional de 10,5%. Esse padrão reflete diferenças nos hábitos alimentares e nos níveis de industrialização de cada região.

De acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE, 18,4% das calorias ingeridas pelos brasileiros vêm de ultraprocessados, enquanto apenas 49,5% são provenientes de alimentos in natura. Essa substituição de alimentos saudáveis por produtos industrializados tem contribuído para o aumento das doenças crônicas e o consequente impacto nos sistemas de saúde e previdência.

Por Que o Consumo de Ultraprocessados é Tão Prejudicial?

A literatura científica é clara ao estabelecer a relação entre o consumo de ultraprocessados e o aumento de doenças crônicas. Esses produtos são ricos em calorias vazias, ou seja, calorias que fornecem energia, mas poucos nutrientes essenciais. Além disso, sua formulação muitas vezes inclui ingredientes que aumentam a inflamação no organismo, como gorduras trans e açúcares refinados.

Doenças como obesidade, diabetes tipo 2 e hipertensão são algumas das condições mais associadas ao consumo desses produtos. Essas condições, por sua vez, aumentam o risco de complicações graves, como ataques cardíacos, derrames e insuficiência renal. O impacto na saúde pública é, portanto, profundo, com uma carga crescente de doenças que poderiam ser evitadas com mudanças nos padrões alimentares.

O Papel da Tributação e da Regulação

Uma das estratégias para combater o impacto dos ultraprocessados na saúde pública é a regulação e a tributação desses produtos. Países como México e Chile já implementaram políticas de taxação de alimentos e bebidas com alto teor de açúcar, resultando em uma redução no consumo. No Brasil, a reforma tributária em discussão no Congresso Nacional pode incluir medidas semelhantes.

Marília Albiero, da ACT Promoção da Saúde, argumenta que evidências científicas devem guiar a criação de políticas públicas para desestimular o consumo de ultraprocessados e promover uma alimentação mais saudável. A taxação seletiva, por exemplo, pode tornar esses produtos menos acessíveis e incentivar o consumo de alimentos frescos e nutritivos.

Como Reduzir o Consumo de Ultraprocessados?

Embora as políticas públicas sejam essenciais, mudanças individuais também são importantes. Algumas estratégias incluem:

  • Planejar as refeições: Priorizar alimentos in natura, como frutas, legumes, verduras, carnes magras e grãos integrais.
  • Ler os rótulos: Identificar alimentos com menos aditivos e menor teor de açúcar, sódio e gorduras.
  • Cozinhar mais em casa: Preparar as refeições em casa permite maior controle sobre os ingredientes utilizados.
  • Evitar a compra por impulso: Fazer compras com uma lista ajuda a evitar produtos industrializados desnecessários.

O SUS na Linha de Frente

O SUS continua sendo um pilar essencial no combate às consequências do consumo de ultraprocessados. Além de tratar as doenças relacionadas, o sistema também promove campanhas de educação alimentar e incentiva hábitos saudáveis por meio de programas como o Guia Alimentar para a População Brasileira. No entanto, o sucesso dessas iniciativas depende da conscientização coletiva e do apoio a políticas públicas que priorizem a saúde.

Conclusão

Os alimentos ultraprocessados representam um desafio significativo para a saúde pública e para o sistema de saúde no Brasil. O custo anual de R$ 10,4 bilhões é uma cifra alarmante, que reflete tanto os gastos diretos com o tratamento de doenças quanto as perdas econômicas associadas a mortes prematuras. Para enfrentar esse problema, é crucial adotar uma abordagem integrada que inclua políticas públicas eficazes, como a tributação seletiva, e ações educativas para incentivar escolhas alimentares mais saudáveis.

O SUS desempenha um papel fundamental nessa luta, mas é responsabilidade de todos — governos, empresas, profissionais de saúde e indivíduos — trabalhar juntos para reduzir o impacto dos ultraprocessados e construir um futuro mais saudável para o Brasil.